Tenho duas gatas, Tica e
Bela, a primeira mãe da segunda.
Foram separadas pouco
tempo após o nascimento da Bela, e a partir de então viveram muito tempo em
ambientes completamente diferentes. Enquanto a Tica envelheceu sem limites de
espaço, tendo outros filhotes, se fortalecendo e conservando hábitos de caça e
de defesa, Bela, sua cria, foi confinada em ambiente menor, com janelas gradeadas,
em ambiente totalmente controlado.
Agora, depois de anos, voltei
a reuni-las, e o caos se alojou aqui em casa. Passo o dia evitando que se
matem, separando brigas e as afastando uma da outra.
Fico pensando se terá
sido a minha interferência, ao separa-las, que fez com que a mãe e sua cria
agora não se reconheçam mais e não possam mais viver juntas.
Não sei como se processam
as emoções dos felinos, mas por um momento trago a experiência para o lado
“humano”.
Será que ao sermos
levados pela vida para direções inesperadas, nos transformamos a ponto de
desfazer laços que julgávamos fortes?
Imagino que sim, em
alguns casos.
Creio que laços emocionais
são construídos e alimentados dia a dia, e quando deixamos de cultiva-los se
enfraquecem e, muitas vezes, são completamente eliminados. Mesmo que algum dia
retomemos a proximidade física, talvez as experiências vividas tenham sido transformadoras
e definitivas, e não nos deixem retornar a um ponto anterior.
No entanto, quando
compartilhamos, em algum momento, sentimentos fortes e maduros, as ligações parecem
não se desfazer. De certa forma, as nossas memórias, vivências familiares e
companheirismo de grandes amigos são impermeáveis ao tempo e distância, mesmo
quando percebemos as sutis diferenças introduzidas por uma ou outra mudança de
itinerário.
Por mais que a vida nos
empurre e nos transforme, ainda somos capazes, na fração de um abraço ou em um
toque das mãos, de refazer a conexão que nunca foi rompida no coração.
Pode ser que minhas gatas
se habituem e passem a viver pacificamente, aceitando a presença uma da outra. A
natureza tem mecanismos de adaptação surpreendentes.
Quanto a nós, ainda temos
que aprender a fortalecer e aprimorar laços de amizade, solidariedade e
convivência, por exemplo.