Nunca tinham se falado pessoalmente, mas se reconheciam há vários meses, por olhares e gestos.
As
janelas, uma em frente à outra, separadas pela pequena praça sem árvores, davam
ampla visão de seus espaços.
Conheciam
todas as rotinas, horários e gostos um do outro.
Ela
tomava café em uma vistosa caneca amarela, todas as manhãs, e lhe acenava
desejando bom dia. Mais tarde, ele a via colocar o mesmo cachecol, e sair
apressada para o trabalho.
Então
ele se sentava em frente à escrivaninha, e escrevia durante horas. Pouco antes
do fim da tarde vigiava o movimento pela praça: a velha senhora com o cachorro,
a mãe com o carrinho de bebê, os estudantes que retornavam da escola. Sabia que
ela não demoraria a chegar.
E
quando já era noite, ele se sentava para admirar a inquieta vizinha.
Acompanhava
divertido a aula de ginástica em frente à TV, o retornar do banho enxugando os
cabelos, e o sorriso encantado - como gostava daquele sorriso - quando se via
observada.
Ambos
se serviam de taças de vinho tinto e desfrutavam da companhia um do outro, à
distância. Ela mostrou o livro de cabeceira, e ele o maço de folhas escritas
para seu próximo livro.
Ela
queimou o assado, ele riu da fumaça que invadiu a sala.
Ele
tropeçou no sofá, mas foi ela que soltou um grito de dor.
Durante
muito tempo colecionaram cumplicidades assim, sem se atreverem a dar o primeiro
passo em direção ao outro.
Mas
o verão chegou, com um convite para que o casal se sentasse naquele banco da
praça, de mãos dadas. Tinham muito o que conversar.
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