31 de maio de 2021

Tenho as estações dentro de mim

Tenho as estações dentro de mim.

Acordo com a primavera, clara e barulhenta, agitando minhas cortinas com sons que espantam meu sono. São as doses de esperança que me preparam para seguir.

Nesse momento, junto energia e os estímulos para o dia, me tornando verão, agitado e alegre. São as fontes frescas e límpidas, mantidas com reflexões e coragem, que me abastecem até o final do dia.

E quando o sol finalmente se despede, sinto o outono da melancolia chegar.

Busco então a companhia das estrelas, mas elas trazem consigo o passado, e imagens que não consigo esquecer.


Me resta a noite de longo e silencioso inverno.



O Reencontro

Nunca tinham se falado pessoalmente, mas se reconheciam há vários meses, por olhares e gestos.

As janelas, uma em frente à outra, separadas pela pequena praça sem árvores, davam ampla visão de seus espaços.

Conheciam todas as rotinas, horários e gostos um do outro.

Ela tomava café em uma vistosa caneca amarela, todas as manhãs, e lhe acenava desejando bom dia. Mais tarde, ele a via colocar o mesmo cachecol, e sair apressada para o trabalho.

Então ele se sentava em frente à escrivaninha, e escrevia durante horas. Pouco antes do fim da tarde vigiava o movimento pela praça: a velha senhora com o cachorro, a mãe com o carrinho de bebê, os estudantes que retornavam da escola. Sabia que ela não demoraria a chegar.

E quando já era noite, ele se sentava para admirar a inquieta vizinha.

Acompanhava divertido a aula de ginástica em frente à TV, o retornar do banho enxugando os cabelos, e o sorriso encantado - como gostava daquele sorriso - quando se via observada.

Ambos se serviam de taças de vinho tinto e desfrutavam da companhia um do outro, à distância. Ela mostrou o livro de cabeceira, e ele o maço de folhas escritas para seu próximo livro.

Ela queimou o assado, ele riu da fumaça que invadiu a sala.

Ele tropeçou no sofá, mas foi ela que soltou um grito de dor.

Durante muito tempo colecionaram cumplicidades assim, sem se atreverem a dar o primeiro passo em direção ao outro.

Mas o verão chegou, com um convite para que o casal se sentasse naquele banco da praça, de mãos dadas. Tinham muito o que conversar.

 



 

Apesar de tudo

Apesar de tudo, ainda temos fé, acreditamos no recomeço.

Tateamos a esmo até encontrar outra mão estendida, para nos aliarmos a favor do bem.

 

Diariamente assistimos ao nascer do sol com os corações aquecidos e iluminados, e assim nos preparamos para enfrentar adversidades.

 

Empenhados, cultivamos jardins, alimentamos pássaros e plantamos novas árvores.

 

Não, não estamos sozinhos. Contamos uns com os outros.

Cantamos juntos. E nossa voz ecoa através de paredes e muros.

Ainda podemos amar com paixão, e esquecer as distâncias e dores.

 

 Em todo o mundo, a palavra está sendo escrita. A mensagem transmitida.

O livro lido com interesse.

 

Hoje declaramos que a esperança venceu o desânimo, e estamos prontos para tentar mais uma vez.

 

Apesar de tudo, somos mais fortes do que imaginávamos.